Segundo uma das vítimas, de 13 anos, ele a teria convencido de perder a virgindade dizendo que se tratava de um sacrifício religioso
“Antes disso tudo vir à tona, eu achava que tinha escolhido o melhor lugar do mundo para viver”. O relato é de uma mulher, de 53 anos, que teria sido vítima de violência sexual dentro de um barracão, na Cidade Ocidental, no Entorno do Distrito Federal.
Além dela, ao menos duas adolescentes, de 13 e 16 anos, também teriam sido abusadas pelo pai de santo do Ilê Axé Catubencimbe. O caso ocorreu no final do ano passado, mas o processo segue na Justiça e o suspeito permanece livre.
O homem denunciado na Polícia Civil de Goiás (PCGO) convivia diariamente com as vítimas. Antônio Roberto Silva do Nascimento, conhecido na comunidade como Betinho, teria cometido as agressões por quase um ano contra as duas menores de idade.
Porém, os abusos sexuais só vieram à tona depois da mulher de 53 anos, uma Ekedi (espécie de auxiliar dos trabalhos), ter sido atacada em um dos aposentos do terreiro, enquanto dormia, em novembro.
Segundo ela relatou à PCGO, estava dormindo juntamente com as filhas e duas adolescentes quando acordou apenas de calcinha. Segundo a vítima, por regra da casa, não é permitida às pessoas dormirem de roupa íntima, por isso, na ocasião, estava vestida com um calção e blusa.
“Como eu tomo medicação para dormir, não percebi nenhuma movimentação estranha durante a noite. Quando acordei, perguntei às meninas se elas haviam tirado o meu calção, mesmo sabendo que não fariam isso. Percebi, então, que alguém havia entrado no barraco em que estávamos, pois o toco que segurava a porta havia sido retirado”, detalha a mulher, que prefere não se identificar.
A vítima revelou o ocorrido para todos os que estavam no local naquele dia, inclusive para a dona do terreiro. Segundo ela, ninguém deu ouvidos e a acusaram, inclusive, de ter sofrido uma alucinação. Contudo, uma das adolescentes que estava no aposento confirmou a suspeita de invasão.
Segundo a menina, um homem vestido com a camiseta de time de futebol e uma bermuda preta havia adentrado ao barracão onde elas estavam. Inconformada com a situação e sem apoio da comunidade, a Ekedi foi à delegacia registrar boletim de ocorrência, acompanhada de uma das filhas e de outra jovem.
Após voltarem da polícia, a jovem que dormia juntamente das outras teria contado para a mulher mais velha quem entrou no barraco delas naquela noite. “Ela me afirmou com muita certeza que viu Betinho no nosso quarto, momento em que teria tirado a minha calça e se esfregado em cima dessa mesma jovem”, disse.
Motivada pela colega, a filha da vítima de 53 anos também revelou ter sido vítima de abuso. Segundo contou para a mãe, a menina de 13 anos sofria violências sexuais de Betinho havia cerca de oito meses. Na primeira investida do suposto agressor, ele a convenceu de perder a virgindade dizendo que se tratava de um sacrifício religioso que, na realidade, não existia.
“Ela não tinha muito conhecimento dos rituais e, mesmo sentindo-se constrangida, achou que, se não o obedecesse, seria punida. É muito triste para uma mãe falar disso. A fé da minha filha é o que me levanta todos os dias, que me faz abrir os olhos e acreditar que a justiça pode ser feita”, declara a mulher.
Desde dezembro do ano passado, o caso corre em segredo no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO). Até o momento, não houve nenhuma decisão em relação ao agendamento de audiência de instrução e julgamento. Contudo, para as vítimas, o processo tem sido demorado.
“Mesmo com o processo correndo, ele conseguiu concluir o rito de iniciação, conhecido como ‘fazer o santo’ e ainda é aceito dentro da comunidade. Por parte dele, recebi várias ameaças por mensagem dizendo que eu iria me arrepender”, detalha a vítima mais velha.
Por medo de represálias, a mulher e as filhas delas mudaram-se para outro lugar, onde estão morando com outros familiares. “Larguei a minha vida para trás. Minha filha quis sumir, ela tem sofrido muito. Nós buscamos por Justiça”, destaca.
O laudo de exame de corpo e delito da menina de 13 anos foi anexado ao processo em julho deste ano, cerca de quatro meses após ter sido concluído. O resultado atesta que houve, de fato, ruptura do hímen da jovem.
“Esse laudo só saiu meses depois porque eu insisti em cobrar, porque estava tudo parado. Os funcionários diziam não estar prontos, mas o resultado estava no sistema desde o dia 4 de março e eles não me informavam nada até então. É um descaso”, lamenta a mãe.
O que diz o outro lado
A reportagem entrou em contato com Antônio Roberto Silva do Nascimento, mas não obteve resposta até o fechamento da matéria. O espaço segue aberto para futuras manifestações.
Fonte: Metrópoles