Acabou!

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(Brasília - DF, 15/10/2019) Presidente da República Jair Bolsonaro, durante Solenidade do 13º do Bolsa Família e Recursos para obras Irmã Dulce.rFoto: Marcos Corrêa/PR

A palavra saiu da boca do Presidente Bolsonaro, o pior de todos os tempos republicanos passados e talvez vindouros, aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no final da tarde do dia primeiro de novembro (2022)

por: Paulo Timm

Tinha que ser ao entardecer, como naqueles velhos filmes em que os duelos eram marcados à las seis de la tarde, para dar um tom de dramaticidade ao feito. Pastelão… Depois de falar dois curtos e elípticos minutos á Nação de sua residência, no Alvorada, Bolsonaro dirigiu-se  à Praça dos Três Poderes, praticamente sozinho, sorridente e brincalhão dizendo que entregava os pontos. Simplesmente patético! Voltou para casa e foi ter com os filhos, os quais continuavam a disparar torpedos incentivando a “resistência” nas Redes Sociais na tentativa de manter a esperança dos seguidores fanatizados  de que  ainda há cartas na manga. Não há. Há apenas um entulho bolsonariano ocupando algumas estradas e que, na forma da Lei da Ordem, será oportunamente removido. Na retomada do curso democrático do país, como deve ser. 

Este é Bolsonaro: Um homem doente do coração, o que lhe afeta a mente, preparado para o combate na guerra, onde falhou, também despreparado para a Política, que menospreza, dissimulando-se de pregador da liberdade. É como se um comandante  espartano desclassificado por Leônidas  para os 300 Imortais das Termópilas,  descesse ao Pireu, em Atenas, para dar lições à Péricles. Ou como se eu, que nada entendo de Física, me metesse a falar de fractais… Ele inventa uma fórmula mágica de obediência às “quatro linhas da Constituição”, que jamais leu, até persuasiva, esquecendo-se que esta é um instrumento sagrado do Pacto Social com um conteúdo uno e indissolúvel que se fundamenta no “Amai-vos uns aos outros”. Ele só ama a si próprio e sua ínclita, embora desengonçada, família. 

Outro militar e Presidente, o General Dutra, de 1946 a 1950,  era um homem igualmente conservador, nem deixou saudades, mas era um homem verdadeiramente honesto porque sempre recorria ao que denominava “Cartinha”, a Constituição, em seus atos. Jamais protagonizou óperas bufas ou ameaças aos outros Poderes da República, embora tenha sido responsável, no curso da Guerra Fria, a cassar o registro do Partido Comunista, que continuou a funcionar, não obstante, na ilegalidade. Bolsonaro não é o primeiro político  dissimulador. Aliás, dialeticamente simulador e dissimulador. Finge ser o político que não é, dissimulando-se no que parece ser: um político.  Segue o Manual dos Ditadores, cuja primeira regra é precisamente fazer-se de vítima salvadora de inimigos imaginários identificados com o Mal, devorando à sua volta aqueles que se aproximam para ajudá-lo, garantindo, sempre, a primazia do trono.

Uma vitória surpreendente que recolocou Lula no mundo político, novamente. Bolsonaro continuará vivo, mas com uma estrada política vulnerável.
Foto: Divulgação

Chega ao ponto de devorá-los e trazê-los de volta á vida, quando lhe convém, como fez com Sérgio Moro. Mas perdeu a eleição, mesmo usando todos os meios espúrios com recursos do Estado para ganhar, deixando um rombo de mais de R$ 200 bilhões nas contas públicas. Dinheiro de helicóptero jogado a rodo sem qualificação adequada dos beneficiários ou distribuído às cegas pelo Orçamento Secreto, nem acompanhamento das políticas correspondentes. Um escândalo calculado como 600 vezes maior do que o Mensalão e 30 vezes maior do que o Petrolão.

Mas se jacta de cara lavada de não ter tido corrupção em seu Governo. E o Ricardo Sales, Ministro do Meio Ambiente, aquele da “boiada” passando por cima das queimadas da Amazônia, saiu por que? E o Milton Ribeiro, da Educação, que mancomunado com os pastores do Orçamento daquela pasta mandava colocar sua foto nas Bíblias compradas com dinheiro público? Oressa ! , diria Guimarães Rosa, se estivesse vivo….

Sempre repetindo que nunca deixou de jogar nas quatro linhas da Vonatituicão Federal, Bolsonaro, por várias vezes confrontou os ministros do STF
Foto: Divulgação TSE

Acabou!, diz Bolsonaro aos Ministros. Mas à Nação, pouco antes, deixou o registro de que deixa como legado ao Brasil uma Direita forte e organizada. Errado. A Direita, no Brasil, desde o Descobrimento, sempre foi forte e dominante na vida nacional, sobretudo nas altas esferas. Aqui e acolá foi sobressaltada pela insurgência revoltosa de negros escravos refugiados nos quilombos ou presentes em Insurreições como a dos Alfaiates e dos Malês, na Bahia, de caboclos revoltados no Cabanagem do Pará, por fanáticos de Antonio Conselheiro, por jacobinos na Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul, que acabariam reverberando sua proclamação rebelde na Revolução de 1930 comandada pelo Governador do Estado Getúlio Vargas. Governos democráticos  mais à esquerda, que jamais se confundiram com revoluções socialistas duraram muito pouco e sempre foram golpeados com ferocidade: Vargas, de 51 a 54, PT, de 2002 a 2014.

Durante o longo período colonial, durante o Império, na maior parte dos anos da República dominou a Casa Grande, expressão simbólica das classes dominantes e predominantes no universo do Estado. Mas tem razão Bolsonaro: Ele transformou em ideologia política institucionalizada os Anos de Chumbo da ditadura militar, naquela época, 1969/74, sob a égide do Ato Institucional no. 5, operada nos porões do próprio Poder de Exceção, por celerados capatazes.

Agora ela está sob o sol, iluminada por supostos 58 milhões de votos, refestelando-se como namoradeiras às janelas da vizinhança à espreita de novo assalto. Seus líderes continuarão se reunindo internacionalmente, obedecendo fielmente a Cartilha do guru Steve Bannon na tentativa de solapar instituições democráticas, demolir Políticas de Estado compensatórias à lei naturalizada do Mercado, como propunha Karl Schimitt, jurista de Hitler que inspirou a Escola da Liberdade de Genebra e disseminar o ódio e o recurso às armas como regra de convivência.

Inicialmente isolado logo após o resultado das eleições, Bolsonaro silenciou. Só foi fazer um comunicado 36 horas depois por pressão de aliados e ministros. Foto: Divulgação

Entre o Pacto e sua administração política, que desprezam, preconizam a política asséptica da administração como negação do conflito. Este legado, sim, Bolsonaro pode se jactar de ter deixado embora sobre ele, agora, se lancem as hienas de ocasião disputando-lhe a carniça. Não é ele, como Trump, um homem igualmente vil, mas  poderoso, que pontifica sobre um dos dois maiores partidos americanos,  o Republicano, em busca da reeleição. É um aventureiro agora destronado que tentará cultivar o imenso caudal de seguidores sob a cobiça de outros neobolsonaristas em ascensão.

O próprio caudal conservador, engrossado pelas bondades eleitorais de última hora, voltará a seu leito tradicional, sejam ricos senhores do engenho partidário, sejam ilustres acadêmicos fascinados pelo neoliberalismo, sejam ingênuos crentes assombrados com a perspectiva da perseguição de Lula às suas modestas Igrejas, sejam as pudicas mães preocupadas com o banheiro unissex. Verão que o mundo real não se confunde com o imaginário mitificado pelo proselitismo fascistóide e seguirão novos – embora não tão novos assim – rumos. Rumos, enfim, que outras linhas do pensamento conservador, à direita, que sempre existiram e existirão, se lhes ofereçam.

Mas será que Acabou mesmo?

Para muitos, Bolsonaro não acredita que ele vá entregar a faixa para o seu sucessor Luís Inácio Lula da Sila
Foto: Divulgação

Pessoalmente, acho que sim. A extrema direita acordou no Brasil, é verdade, e Bolsonaro contribuiu decisivamente para isso. Mas voltará, como a extrema esquerda, da qual, inclusive importou métodos, para a margem do rio, de onde continuará vociferando. Como alternativa para o Brasil, perdeu-se nos destemperos de Bolsonaro. Ficará como amarga lembrança e será lembrada como lição aos pósteros que dirão: “-Eu sei o que vocês fizeram ao Brasil nos anos bolsonarianos”…

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